quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Marco Salton: a união da tradição e ousadia dentro da garrafa!


 Confraria do Sagu recebeu o sócio proprietário e enólogo da Vinícola Valmarino

Enólogo Marco Salton


Éramos 12 à mesa. Sobre ela, garrafas de espumante nos baldes com gelo e outras garrafas de vinho, dezenas de taças e pratos harmonizados, tudo envolvido em conversas descontraídas sobre um único tema: o vinho brasileiro! Até aí nada diferente de qualquer encontro mensal da Confraria do Sagu - confraria de Santa Cruz do Sul especializada na análise técnica de vinhos. Mas o fator que fazia todo o diferencial naquela agradável noite de outubro estava sentado à cabeceira: Marco Antônio Salton, enólogo da multipremiada Vinícola Valmarino, de Pinto Bandeira, na Serra Gaúcha! A convite da confraria, Marco desceu a serra para - em plena Oktoberfest - apresentar a sua linha de produtos. Com amplo conhecimento e linguajar coloquial, o colorado de 49 anos e filho do seu Orval desarrolhou a sua história guardada em muitas barricas de carvalho - transitando com a simplicidade de um cantineiro e conhecimento enológico de PHD - sobre a viticultura brasileira e a sua contribuição neste cenário. E, naquela mesma semana, a Valmarino com seus vinhedos em “latada” foi premiada na 11ª. edição do Concurso do Espumante Brasileiro com 3 espumantes destacados com o troféu Ouro e 1 com o Sabre de Ouro entre as mais de 370 amostras inscritas. Com muita desenvoltura e propriedade, Marco concedeu esta entrevista exclusiva a Gazeta do Sul e blog Eu, Gourmet cujo conteúdo você acompanha a seguir.            

Nome completo: Marco Antonio Salton

Idade: 49 anos

Time que torce: Esportivo de Bento Gonçalves e depois Internacional de Porto Alegre-RS

Cidade que reside: Bento Gonçalves - RS

Nome filhos e idades: Amanda Zini Salton de 18 anos e Rafaela Zini Salton de 15 anos

Nome do cônjuge: Adriane Zini Salton

Formação profissional: Técnico em Enologia e Engenheiro Agrônomo

Empresas em que trabalha(ou):  Sucos Suvalan S/A e Vinícola Valmarino desde 15/9/97

Lida na área do vinho desde: 1991

Como você foi parar na enologia?
Por intermédio de meu pai o enólogo Orval Salton que me convenceu a cursar o técnico em Enologia em 1984 no Instituto Federal em Bento Gonçalves - RS

Como surgiu a Vinícola Valmarino?
Surgiu do sonho do meu pai em ter uma vinícola própria e elaborar vinhos diferenciados a partir de vinhedos igualmente próprios. Como tínhamos a propriedade em Pinto Bandeira e estávamos produzindo e comercializando as uvas desde 1978 sentimos a necessidade de diversificação e ampliação do negócio além da busca de uma realização pessoal e profissional. Então em 15 de Setembro de 1997 fundamos o Estabelecimento Vinícola Valmarino buscando resgatar parte da história da família de origem italiana da cidade de Cison di Valmarino – Treviso. Eu e meus irmãos e sócios Guilherme e Rodrigo fundamos a vinícola. Estamos atualmente com 21 ha próprios de vinhedos na localidade de Pinto Bandeira com 14 variedades de uvas viníferas. De lá para cá já elaboramos aproximadamente 30 rótulos distintos em 6 marcas diferentes.

Fale-nos sobre a linha Churchill:
Surgiu da parceria com o americano Nathan Churchill que vive em São Paulo e representa uma tonelaria americana no Brasil. Desde 2006 estamos elaborando vinhos e espumantes que maturam e envelhecem em barricas de carvalho, possibilitando a obtenção de produtos distintos e de maior complexidade de aromas e sabores.

Como você administra a qualidade e manejo de seus vinhedos para elaborar rótulos diferenciados?
O que sempre buscamos é a máxima expressão da variedade de uva de acordo com o nosso solo e clima. Arriscamos ao máximo em maturar as uvas no vinhedo alongando seu período de maturação e colheita de acordo com as condições climáticas do ano. Os tratos culturais no vinhedo são fundamentais para isto, mas a questão de trabalhar com amor a terra e uma paixão em busca do melhor vinho são imprescindíveis.

Salton repassou um pouco de sua história no encontro da Confraria do Sagu

Quais são os seus rótulos mais premiados?
O vinho mais premiado e reconhecido da vinícola é o Cabernet Franc. Temos uma ligação afetiva com ele, pois foi a primeira uva vinífera plantada na propriedade em 1978. Notamos uma vocação natural por esta variedade que nosso pai tinha grande apreço. Mas alguns espumantes pelo método tradicional tem-se destacado ano a ano em premiações e reconhecimentos. Em especial o Nature Valmarino e o espumante da linha Churchill com envelhecimento em barricas de carvalho.

É possível produzir vinhos de alta qualidade no Brasil?
Sim. Com a implantação de novos vinhedos, com clones específicos de videiras e em novas áreas de cultivo melhoramos muito na parte do campo. O trabalho é árduo pois lutamos constantemente para amenizar os efeitos do clima na maturação das uvas. Estamos no caminho certo!

O Brasil - e em especial o RS - tem ainda como melhorar seus vinhos seja nos atuais vinhedos ou em novas e promissoras regiões?
Sim. Temos um longo caminho pela frente. Precisamos de um maior incentivo ao setor vitivinícola. Se baixar os impostos o negócio anda por conta própria. Temos um grande mercado de consumo em potencial. Precisamos incentivar o consumo do vinho em todas as classes sociais. Sempre tem algo novo a ser explorado. Muitas regiões foram descobertas ao acaso. Então a observação é muito importante e aí entra o viticultor que aposta em variedades adaptadas a cada região e clima.

Fale um pouco do terroir de Pinto Bandeira e o que ele tem que os outros não possuem? Como extrair o melhor desta parcela de vinhas?
Pinto Bandeira está inserido na Serra Gaúcha que é uma região cheia de particularidades. São vários aspectos que devem ser levados em conta. Primeiramente a altitude em torno de 700 metros que permite uma excelente insolação e ventilação das uvas. A declividade dos terrenos favorece muito a drenagem da água em excesso. Já as características do solo com muita decomposição de rochas tem sido ideal para algumas variedades de uva, como a Chardonnay entre as brancas e o Cabernet Franc entre as tintas. Mas acredito que o fator mais marcante seja a mão do homem que está lá trabalhando e buscando revelar este singular diferencial a cada safra de uva.




“O melhor vinho está relacionado as emoções que você sente em bebê-lo em determinado momento e que marca a sua existência”. Marco Salton




A Valmarino aposta em variedades não tão usuais no âmbito brasileiro tais como Cabernet Franc, Petit Verdot, Syrah, Sangiovese.  O porquê de cultivá-las?
Quando decidimos cultivar uma variedade diferente pesquisamos todo seu histórico e os clones existentes que melhor se adaptariam em nossa região. Mas cada variedade tem um propósito, como a Cabernet Franc que foi plantada em 1978 na propriedade pois era a melhor tinta vinífera da época e que adaptou-se muito bem em nosso terroir.  A Sangiovese devido a ser muito cultivada na região no passado e que ficou esquecida, pois acreditamos no seu potencial além de não perder a raiz italiana da família. As demais variedades como Petit Verdot, Shiraz e mais recentemente a Marselan por questões estratégicas de mercado e pelas características que possam aportar em vinhos de corte que lançaremos em breve.

Você é adepto a passagem de seus vinhos tintos por barrica assim como os espumantes. Qual o resultado disso para o consumidor final?
Somos adeptos a utilização da barrica de carvalho, pois em nossa filosofia todo o grande vinho precisa maturar e envelhecer antes de ir para a garrafa. E a melhor forma de maturar é na barrica de carvalho. Ela permite a micro oxigenação do vinho e com isto os taninos começam a fundir-se com os taninos da madeira ficando mais macios além de aportar estrutura, aromas e sabores únicos dependendo das características do vinho. Mas para a utilização do carvalho estudamos a origem da madeira, seu beneficiamento, sua forma de secagem e o seu grau de tostagem. Isto permite você optar para cada tipo de vinho e de safra o tipo de madeira a ser utilizada. Normalmente optamos pelas barricas americanas por acreditar que realmente fazem a diferença no vinho da Valmarino, é uma questão de estilo próprio. No caso dos espumantes observei que várias casas de Champagne utilizam barricas para dar complexidade, estrutura e maturação de seus vinhos base. Então resolvemos imprimir na Valmarino esta mesma prática para uma linha específica de espumantes com estas características para atender um nicho de mercado. Espumantes que tiverem o seu vinho base maturado em barricas de carvalho tem características mais gastronômicas e com isso permite ao seu consumidor a harmonização com pratos mais elaborados com frutos do mar, ostras, diversos tipos de paellas e até bacalhau.

De que forma o enólogo consegue extrair o máximo de qualidade e elaborar bons vinhos numa safra ruim?
Em safras ruins o enólogo tem que tomar a decisão certa de colher ou não esta uva. Se decidir colher tem que classificar ao máximo as uvas (ainda no vinhedo) para amenizar possíveis defeitos ao vinho. Neste caso são realizados procedimentos de vinificação distintos e específicos para cada uva na busca de obter um vinho saudável e correto na parte química e sensorial, normalmente vinhos mais leves.  

Valmarino elabora vinhos e espumantes

Qual é a sua opinião sobre os vinhos orgânicos e biodinâmicos? É uma tendência?
Acho bastante interessante esta prática principalmente em regiões que tem um clima mais seco e estável. Aqui no Brasil é muito difícil optar por estas práticas. Acredito que para algumas variedades de uvas americanas e mais rústicas isto possa ocorrer 100% em determinados anos menos chuvosos. No caso das uvas viníferas acredito que estamos aprendendo ano a ano a administrar algumas práticas que podem ser interessantes junto com o cultivo tradicional. Estamos evoluindo e tem uma certa corrente tendendo a este lado. Na Valmarino na questão dos vinhedos buscamos aliar algumas práticas naturais ao cultivo convencional. Observamos o calendário astronômico de podas e enxertias, adotamos práticas no solo de manter um solo aerado, com microrganismos naturais e elementos disponíveis a videira além de boa drenagem. Quanto aos tratamentos fitossanitários mantemos a intenção de ano a ano utilizar cada vez menos optando em alguns casos no final da maturação das uvas de usar somente o sulfato de cobre que é considerado natural dentro do cultivo orgânico. No caso do vinho também buscamos a menor intervenção possível, diminuindo ano a ano as doses de sulfitos e produtos enológicos. Queremos um vinho o mais natural possível e que expresse nosso local e a nossa maneira de fazer.

Qual sua uva preferida?  
Cabernet Franc.

Conte qual é o melhor vinho que você já degustou?
O melhor vinho está relacionado as emoções que você sente em bebê-lo em determinado momento e que marca a sua existência. A primeira vez que senti isto foi na Toscana na empresa Dievole que estávamos visitando com a Confraria do Vinho de Bento Gonçalves. Eles criaram vários ambientes em que era mostrado um vinho relacionado ao local. Emocionei-me dentro de uma igreja que fazia parte da vinícola onde era servido um vinho Sangiovese/Cabernet Sauvignon harmonizado com queijo pecorino e ao fundo um canto gregoriano que soava muito delicado e fez com que eu me emocionasse muito... Isto marcou demais, pois além do ambiente místico o vinho era sensacional!

Espumantes com passagem por barrica de carvalho

A tecnologia faz diferença na produção de vinhos? Onde ela aparece?
O vinho evoluiu muito em qualidade com a tecnologia. Isto facilita para não errar e se existe vamos utilizar, este é o nosso lema da Valmarino. A tecnologia faz a diferença no vinhedo para os equipamentos agrícolas pois permite uma otimização do tempo e eficiência de aplicação dos agroquímicos. Já dentro da vinícola é fundamental para revelar a qualidade das uvas e manter seu padrão em todo o processo. Começa desde a desengaçadeira da uva que separa o cacho (ráquis) do grão, os tanques de inox com controle de temperatura, leveduras selecionadas de fermentação, prensa, bombas, filtro e  engarrafadora. Tudo isto utilizado com o maior cuidado para não alterar a estrutura e a composição natural do vinho.

No Uruguai temos o Tannat, na Argentina o Malbec, no Chile o Cabernet Sauvignon. Qual a casta tinta que você considera que poderá ser o cartão de visitas do Brasil?
Acredito muito na Cabernet Franc. Mas no geral devido a estar muito bem adaptada as condições de clima do Rio Grande do Sul e pela sua expressiva área de produção a Merlot é a variedade que poderá ser considerada emblemática. Normalmente ela produz vinhos elegantes e fáceis de beber que harmonizam perfeitamente com a nossa culinária.

O que as vinícolas brasileiras podem fazer para alcançarem o patamar de preço e qualidade dos países produtores vizinhos?
São várias frentes a serem trabalhadas pelas vinícolas brasileiras no médio e longo prazo: buscar clones e variedades de uvas que produzem bem, com qualidade e custo final menor de produção; ter uma parte agrícola sustentável temos de atacar a questão dos custos com insumos buscando negociações e melhores preços para termos competitividade; trabalhar a parte mercadológica fazendo parcerias e treinamentos constantes de pessoal; difundir o hábito do consumo de vinho além de resgatar um pouco o nacionalismo pela bebida; e a parte decisiva e de rápida resposta é trabalhar junto aos órgãos competentes a menor tributação possível para a bebida com metas claras e passíveis de realização para o crescimento do mercado de vinhos brasileiros.



Qual o vinho que você elaborou que mais orgulho lhe deu?
Foi o Cabernet Franc 2005 lançado na edição comemorativa dos 10 anos da vinícola em 2007 que na época foi escolhido o melhor vinho brasileiro na Avaliação Nacional de Vinhos 2005, uma safra emblemática. Este foi o vinho mais premiado da vinícola e cultuado por várias pessoas. Ele abriu as portas da Valmarino para o mercado consumidor.

Prato preferido?
Lasanha de frango.

Restaurante preferido?
Mamma Gema, no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves.

Uma vinícola - fora a que você trabalha - que admira, seja no Brasil ou no mundo?
Vinícola Villard,  no Chile.

Personalidade admirada na área do vinho?
Professor Firmino Splendor.

Enólogo do vinho brasileiro que admira?
Adriano Miolo.

Enólogo recebeu honraria pela sua contribuição no desenvolvimento do vinho brasileiro
pelas mãos do confrade Sandor Hoppe

Conte algum fato pitoresco ocorrido durante a sua vida como enólogo:
Um fato interessante foi quando um cliente chegou no varejo da vinícola, com uma cara séria e meia fechada, entrou, olhou a todos que estavam lá e pediu para falar com o enólogo.  Imediatamente o funcionário foi me chamar meio amedrontado. Então fui até o varejo e lá chegando a pessoa se apresentou e disse que gostaria de me conhecer e me abraçar por ter feito um vinho tão bom que ele havia tomado na noite anterior em um restaurante de Bento Gonçalves. Abraçou-me e eu me emocionei. Ao sair levou uma caixa de Cabernet Franc junto. Para mim ficou a lição de que o maior prêmio a ser conquistado é o consumidor, e isto não tem preço e sim muito prazer e satisfação!

Como você enxerga a viticultura brasileira daqui a 10 anos e como a Valmarino estará neste contexto?
Enxergo com muito entusiasmo a vitivinicultura brasileira pois estamos em franca expansão de novas áreas de cultivo e principalmente o despertar do consumidor que está ávido por novos vinhos, novos sabores e pela cultura do vinho como um todo. A Valmarino é um sonho que vamos concretizando ano após ano na busca de produtos diferenciados e que sejam cultuados pelos consumidores. Que daqui a 10 anos sejamos uma referência nacional de empresa familiar produtora de vinho e de espumantes de alta gama e excelência.

A Confraria do Sagu

O que gostaria de fazer que ainda não fez em termos de vinho?
Em termos de vinho pretendemos fazer alguns vinhos licorosos que acreditamos ter grande potencial em nossa região.  Entre os sonhos a serem realizados está a elaboração de destilados de vinho (brandy) e destilados de cascas de uva (grappa) afinal temos grande afinidade com estes bebidas e completariam a nossa linha de produtos.

Deixe uma dica para quem está começando a se interessar em beber vinhos:
Seja curioso e busque conhecer o máximo de detalhes de como o vinho que você está bebendo foi elaborado e qual a melhor comida para apreciar suas características.

Espumantes Valmarino premiados na 11ª. edição do Concurso do Espumante Brasileiro no dia 18 de outubro de 2019, em Garibaldi/RS:

Destaque Sabre de Ouro – Categoria Espumante Nature:
Valmarino Espumante Nature Sur Lie 2015
Medalhas de Ouro:
Valmarino & Churchill Espumante Extra Brut 2015
Valmarino Espumante Brut Tradicional - IP Pinto Bandeira 2016
Valmarino Espumante Nature 2013

Baco fala:

O espumante Valmarino & Churchill Espumante Extra Brut 2015 recebeu a Medalha de Ouro na edição deste ano do Concurso do Espumante Brasileiro e foi servido por Salton durante a sua palestra. É elaborado com 70% Chardonnay e 30% Pinot Noir e maturou em barricas de carvalho americano de 2º e 3º uso por um período de 12 meses antes de ser engarrafado além e 24 meses de maturação na garrafa. Possui coloração amarela com tons dourados, prolongado e fino perlage, intensos aromas cítricos, lácteos e tostados com grande estrutura em boca, ótima acidez, frescor e cremosidade e longa persistência. Ideal ao acompanhamento de pratos elaborados a base de peixes e frutos do mar mais elaborados e estruturados além de paellas, frango e coelho.

Possui 12% de graduação alcoólica e o ideal é ser consumido na temperatura de 6 a 8oC.

Você encontra os vinhos e espumantes Valmarino na Wein Haus, loja especializada em vinhos, localizada na Rua João Pessoa 895, Santa Cruz do Sul, fone (51) 3711.3665 e site www.weinhaus.com.br.

E lembre-se: se beber, NÃO DIRIJA!      

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