Confraria do Sagu
recebeu o sócio proprietário e enólogo da Vinícola Valmarino
Enólogo Marco Salton |
Éramos 12 à mesa. Sobre ela,
garrafas de espumante nos baldes com gelo e outras garrafas de vinho, dezenas
de taças e pratos harmonizados, tudo envolvido em conversas descontraídas sobre
um único tema: o vinho brasileiro! Até aí nada diferente de qualquer encontro
mensal da Confraria do Sagu - confraria de Santa Cruz do Sul especializada na
análise técnica de vinhos. Mas o fator que fazia todo o diferencial naquela
agradável noite de outubro estava sentado à cabeceira: Marco Antônio Salton,
enólogo da multipremiada Vinícola Valmarino, de Pinto Bandeira, na Serra
Gaúcha! A convite da confraria, Marco desceu a serra para - em plena
Oktoberfest - apresentar a sua linha de produtos. Com amplo conhecimento e
linguajar coloquial, o colorado de 49 anos e filho do seu Orval desarrolhou a
sua história guardada em muitas barricas de carvalho - transitando com a
simplicidade de um cantineiro e conhecimento enológico de PHD - sobre a
viticultura brasileira e a sua contribuição neste cenário. E, naquela mesma
semana, a Valmarino com seus vinhedos em “latada” foi premiada na 11ª. edição
do Concurso do Espumante Brasileiro com 3 espumantes destacados com o troféu
Ouro e 1 com o Sabre de Ouro entre as mais de 370 amostras inscritas. Com muita
desenvoltura e propriedade, Marco concedeu esta entrevista exclusiva a Gazeta do Sul e blog Eu, Gourmet cujo conteúdo você
acompanha a seguir.
Nome completo: Marco Antonio Salton
Idade: 49 anos
Time que torce: Esportivo de Bento Gonçalves e depois Internacional
de Porto Alegre-RS
Cidade que reside: Bento Gonçalves - RS
Nome filhos e idades: Amanda Zini Salton de 18 anos e Rafaela Zini
Salton de 15 anos
Nome do cônjuge: Adriane Zini Salton
Formação profissional: Técnico em Enologia e Engenheiro Agrônomo
Empresas em que trabalha(ou): Sucos
Suvalan S/A e Vinícola Valmarino desde 15/9/97
Lida na área do vinho desde: 1991
Como você foi parar na enologia?
Por intermédio de meu pai o
enólogo Orval Salton que me convenceu a cursar o técnico em Enologia em 1984 no
Instituto Federal em Bento Gonçalves - RS
Como surgiu a Vinícola Valmarino?
Surgiu do sonho do meu pai em
ter uma vinícola própria e elaborar vinhos diferenciados a partir de vinhedos
igualmente próprios. Como tínhamos a propriedade em Pinto Bandeira e estávamos
produzindo e comercializando as uvas desde 1978 sentimos a necessidade de
diversificação e ampliação do negócio além da busca de uma realização pessoal e
profissional. Então em 15 de Setembro de 1997 fundamos o Estabelecimento
Vinícola Valmarino buscando resgatar parte da história da família de origem
italiana da cidade de Cison di Valmarino – Treviso. Eu e meus irmãos e sócios
Guilherme e Rodrigo fundamos a vinícola. Estamos atualmente com 21 ha próprios
de vinhedos na localidade de Pinto Bandeira com 14 variedades de uvas
viníferas. De lá para cá já elaboramos aproximadamente 30 rótulos distintos em
6 marcas diferentes.
Fale-nos sobre a linha Churchill:
Surgiu da parceria com o
americano Nathan Churchill que vive em São Paulo e representa uma tonelaria
americana no Brasil. Desde 2006 estamos elaborando vinhos e espumantes que
maturam e envelhecem em barricas de carvalho, possibilitando a obtenção de
produtos distintos e de maior complexidade de aromas e sabores.
Como você administra a qualidade e manejo de seus vinhedos para elaborar
rótulos diferenciados?
O que sempre buscamos é a
máxima expressão da variedade de uva de acordo com o nosso solo e clima.
Arriscamos ao máximo em maturar as uvas no vinhedo alongando seu período de
maturação e colheita de acordo com as condições climáticas do ano. Os tratos
culturais no vinhedo são fundamentais para isto, mas a questão de trabalhar com
amor a terra e uma paixão em busca do melhor vinho são imprescindíveis.
Salton repassou um pouco de sua história no encontro da Confraria do Sagu |
Quais são os seus rótulos mais premiados?
O vinho mais premiado e
reconhecido da vinícola é o Cabernet Franc. Temos uma ligação afetiva com ele,
pois foi a primeira uva vinífera plantada na propriedade em 1978. Notamos uma
vocação natural por esta variedade que nosso pai tinha grande apreço. Mas
alguns espumantes pelo método tradicional tem-se destacado ano a ano em
premiações e reconhecimentos. Em especial o Nature Valmarino e o espumante da
linha Churchill com envelhecimento em barricas de carvalho.
É possível produzir vinhos de alta qualidade no Brasil?
Sim. Com a implantação de
novos vinhedos, com clones específicos de videiras e em novas áreas de cultivo
melhoramos muito na parte do campo. O trabalho é árduo pois lutamos
constantemente para amenizar os efeitos do clima na maturação das uvas. Estamos
no caminho certo!
O Brasil - e em especial o RS - tem ainda como melhorar seus vinhos
seja nos atuais vinhedos ou em novas e promissoras regiões?
Sim. Temos um longo caminho
pela frente. Precisamos de um maior incentivo ao setor vitivinícola. Se baixar
os impostos o negócio anda por conta própria. Temos um grande mercado de
consumo em potencial. Precisamos incentivar o consumo do vinho em todas as
classes sociais. Sempre tem algo novo a ser explorado. Muitas regiões foram
descobertas ao acaso. Então a observação é muito importante e aí entra o
viticultor que aposta em variedades adaptadas a cada região e clima.
Fale um pouco do terroir de
Pinto Bandeira e o que ele tem que os outros não possuem? Como extrair o melhor desta parcela de
vinhas?
Pinto Bandeira está inserido
na Serra Gaúcha que é uma região cheia de particularidades. São vários aspectos
que devem ser levados em conta. Primeiramente a altitude em torno de 700 metros
que permite uma excelente insolação e ventilação das uvas. A declividade dos
terrenos favorece muito a drenagem da água em excesso. Já as características do
solo com muita decomposição de rochas tem sido ideal para algumas variedades de
uva, como a Chardonnay entre as brancas e o Cabernet Franc entre as tintas. Mas
acredito que o fator mais marcante seja a mão do homem que está lá trabalhando
e buscando revelar este singular diferencial a cada safra de uva.
“O melhor vinho está relacionado as emoções que você sente
em bebê-lo em determinado momento e que marca a sua existência”. Marco Salton
A Valmarino aposta em variedades não tão usuais no âmbito brasileiro
tais como Cabernet Franc, Petit Verdot, Syrah, Sangiovese. O porquê de cultivá-las?
Quando decidimos cultivar uma
variedade diferente pesquisamos todo seu histórico e os clones existentes que
melhor se adaptariam em nossa região. Mas cada variedade tem um propósito, como
a Cabernet Franc que foi plantada em 1978 na propriedade pois era a melhor
tinta vinífera da época e que adaptou-se muito bem em nosso terroir. A Sangiovese devido a ser muito cultivada na
região no passado e que ficou esquecida, pois acreditamos no seu potencial além
de não perder a raiz italiana da família. As demais variedades como Petit
Verdot, Shiraz e mais recentemente a Marselan por questões estratégicas de
mercado e pelas características que possam aportar em vinhos de corte que
lançaremos em breve.
Você é adepto a passagem de seus vinhos tintos por barrica assim como
os espumantes. Qual o resultado disso para o consumidor final?
Somos adeptos a utilização da
barrica de carvalho, pois em nossa filosofia todo o grande vinho precisa
maturar e envelhecer antes de ir para a garrafa. E a melhor forma de maturar é
na barrica de carvalho. Ela permite a micro oxigenação do vinho e com isto os
taninos começam a fundir-se com os taninos da madeira ficando mais macios além
de aportar estrutura, aromas e sabores únicos dependendo das características do
vinho. Mas para a utilização do carvalho estudamos a origem da madeira, seu
beneficiamento, sua forma de secagem e o seu grau de tostagem. Isto permite
você optar para cada tipo de vinho e de safra o tipo de madeira a ser
utilizada. Normalmente optamos pelas barricas americanas por acreditar que
realmente fazem a diferença no vinho da Valmarino, é uma questão de estilo
próprio. No caso dos espumantes observei que várias casas de Champagne utilizam
barricas para dar complexidade, estrutura e maturação de seus vinhos base.
Então resolvemos imprimir na Valmarino esta mesma prática para uma linha
específica de espumantes com estas características para atender um nicho de
mercado. Espumantes que tiverem o seu vinho base maturado em barricas de
carvalho tem características mais gastronômicas e com isso permite ao seu
consumidor a harmonização com pratos mais elaborados com frutos do mar, ostras,
diversos tipos de paellas e até bacalhau.
De que forma o enólogo consegue extrair o máximo de qualidade e
elaborar bons vinhos numa safra ruim?
Em safras ruins o enólogo tem
que tomar a decisão certa de colher ou não esta uva. Se decidir colher tem que
classificar ao máximo as uvas (ainda no vinhedo) para amenizar possíveis
defeitos ao vinho. Neste caso são realizados procedimentos de vinificação distintos
e específicos para cada uva na busca de obter um vinho saudável e correto na
parte química e sensorial, normalmente vinhos mais leves.
Valmarino elabora vinhos e espumantes |
Qual é a sua opinião sobre os vinhos orgânicos e biodinâmicos? É uma
tendência?
Acho bastante interessante
esta prática principalmente em regiões que tem um clima mais seco e estável.
Aqui no Brasil é muito difícil optar por estas práticas. Acredito que para
algumas variedades de uvas americanas e mais rústicas isto possa ocorrer 100%
em determinados anos menos chuvosos. No caso das uvas viníferas acredito que
estamos aprendendo ano a ano a administrar algumas práticas que podem ser
interessantes junto com o cultivo tradicional. Estamos evoluindo e tem uma
certa corrente tendendo a este lado. Na Valmarino na questão dos vinhedos
buscamos aliar algumas práticas naturais ao cultivo convencional. Observamos o
calendário astronômico de podas e enxertias, adotamos práticas no solo de
manter um solo aerado, com microrganismos naturais e elementos disponíveis a
videira além de boa drenagem. Quanto aos tratamentos fitossanitários mantemos a
intenção de ano a ano utilizar cada vez menos optando em alguns casos no final
da maturação das uvas de usar somente o sulfato de cobre que é considerado
natural dentro do cultivo orgânico. No caso do vinho também buscamos a menor
intervenção possível, diminuindo ano a ano as doses de sulfitos e produtos
enológicos. Queremos um vinho o mais natural possível e que expresse nosso
local e a nossa maneira de fazer.
Qual sua uva preferida?
Cabernet Franc.
Conte qual é o melhor vinho que você já degustou?
O melhor vinho está
relacionado as emoções que você sente em bebê-lo em determinado momento e que marca
a sua existência. A primeira vez que senti isto foi na Toscana na empresa
Dievole que estávamos visitando com a Confraria do Vinho de Bento Gonçalves.
Eles criaram vários ambientes em que era mostrado um vinho relacionado ao
local. Emocionei-me dentro de uma igreja que fazia parte da vinícola onde era
servido um vinho Sangiovese/Cabernet Sauvignon harmonizado com queijo pecorino
e ao fundo um canto gregoriano que soava muito delicado e fez com que eu me
emocionasse muito... Isto marcou demais, pois além do ambiente místico o vinho
era sensacional!
Espumantes com passagem por barrica de carvalho |
A tecnologia faz diferença na produção de vinhos? Onde ela aparece?
O vinho evoluiu muito em
qualidade com a tecnologia. Isto facilita para não errar e se existe vamos
utilizar, este é o nosso lema da Valmarino. A tecnologia faz a diferença no
vinhedo para os equipamentos agrícolas pois permite uma otimização do tempo e
eficiência de aplicação dos agroquímicos. Já dentro da vinícola é fundamental
para revelar a qualidade das uvas e manter seu padrão em todo o processo.
Começa desde a desengaçadeira da uva que separa o cacho (ráquis) do grão, os
tanques de inox com controle de temperatura, leveduras selecionadas de
fermentação, prensa, bombas, filtro e engarrafadora. Tudo isto utilizado com o maior
cuidado para não alterar a estrutura e a composição natural do vinho.
No Uruguai temos o Tannat, na Argentina o Malbec, no Chile o Cabernet
Sauvignon. Qual a casta tinta que você considera que poderá ser o cartão de
visitas do Brasil?
Acredito muito na Cabernet
Franc. Mas no geral devido a estar muito bem adaptada as condições de clima do
Rio Grande do Sul e pela sua expressiva área de produção a Merlot é a variedade
que poderá ser considerada emblemática. Normalmente ela produz vinhos elegantes
e fáceis de beber que harmonizam perfeitamente com a nossa culinária.
O que as vinícolas brasileiras podem fazer para alcançarem o patamar de
preço e qualidade dos países produtores vizinhos?
São várias frentes a serem
trabalhadas pelas vinícolas brasileiras no médio e longo prazo: buscar clones e
variedades de uvas que produzem bem, com qualidade e custo final menor de produção;
ter uma parte agrícola sustentável temos de atacar a questão dos custos com
insumos buscando negociações e melhores preços para termos competitividade; trabalhar
a parte mercadológica fazendo parcerias e treinamentos constantes de pessoal; difundir
o hábito do consumo de vinho além de resgatar um pouco o nacionalismo pela
bebida; e a parte decisiva e de rápida resposta é trabalhar junto aos órgãos
competentes a menor tributação possível para a bebida com metas claras e
passíveis de realização para o crescimento do mercado de vinhos brasileiros.
Qual o vinho que você elaborou que mais orgulho lhe deu?
Foi o Cabernet Franc 2005
lançado na edição comemorativa dos 10 anos da vinícola em 2007 que na época foi
escolhido o melhor vinho brasileiro na Avaliação Nacional de Vinhos 2005, uma
safra emblemática. Este foi o vinho mais premiado da vinícola e cultuado por
várias pessoas. Ele abriu as portas da Valmarino para o mercado consumidor.
Prato preferido?
Lasanha de frango.
Restaurante preferido?
Mamma Gema, no Vale dos
Vinhedos, em Bento Gonçalves.
Uma vinícola - fora a que você trabalha - que admira, seja no Brasil ou
no mundo?
Vinícola Villard, no Chile.
Personalidade admirada na área do vinho?
Professor Firmino Splendor.
Enólogo do vinho brasileiro que admira?
Adriano Miolo.
Enólogo recebeu honraria pela sua contribuição no desenvolvimento do vinho brasileiro pelas mãos do confrade Sandor Hoppe |
Conte algum fato pitoresco ocorrido durante a sua vida como enólogo:
Um fato interessante foi
quando um cliente chegou no varejo da vinícola, com uma cara séria e meia
fechada, entrou, olhou a todos que estavam lá e pediu para falar com o
enólogo. Imediatamente o funcionário foi
me chamar meio amedrontado. Então fui até o varejo e lá chegando a pessoa se
apresentou e disse que gostaria de me conhecer e me abraçar por ter feito um vinho
tão bom que ele havia tomado na noite anterior em um restaurante de Bento
Gonçalves. Abraçou-me e eu me emocionei. Ao sair levou uma caixa de Cabernet
Franc junto. Para mim ficou a lição de que o maior prêmio a ser conquistado é o
consumidor, e isto não tem preço e sim muito prazer e satisfação!
Como você enxerga a viticultura brasileira daqui a 10 anos e como a Valmarino
estará neste contexto?
Enxergo com muito entusiasmo a
vitivinicultura brasileira pois estamos em franca expansão de novas áreas de
cultivo e principalmente o despertar do consumidor que está ávido por novos
vinhos, novos sabores e pela cultura do vinho como um todo. A Valmarino é um
sonho que vamos concretizando ano após ano na busca de produtos diferenciados e
que sejam cultuados pelos consumidores. Que daqui a 10 anos sejamos uma
referência nacional de empresa familiar produtora de vinho e de espumantes de
alta gama e excelência.
A Confraria do Sagu |
O que gostaria de fazer que ainda não fez em termos de vinho?
Em termos de vinho pretendemos
fazer alguns vinhos licorosos que acreditamos ter grande potencial em nossa
região. Entre os sonhos a serem
realizados está a elaboração de destilados de vinho (brandy) e destilados de
cascas de uva (grappa) afinal temos grande afinidade com estes bebidas e
completariam a nossa linha de produtos.
Deixe uma dica para quem está começando a se interessar em beber
vinhos:
Seja curioso e busque conhecer
o máximo de detalhes de como o vinho que você está bebendo foi elaborado e qual
a melhor comida para apreciar suas características.
Espumantes Valmarino premiados na 11ª. edição do Concurso do Espumante Brasileiro
no dia 18 de outubro de 2019, em Garibaldi/RS:
Destaque Sabre de Ouro – Categoria Espumante Nature:
Valmarino Espumante Nature Sur
Lie 2015
Medalhas de Ouro:
Valmarino & Churchill
Espumante Extra Brut 2015
Valmarino Espumante Brut
Tradicional - IP Pinto Bandeira 2016
Valmarino Espumante Nature
2013
Baco fala:
O espumante Valmarino & Churchill Espumante Extra Brut 2015 recebeu a
Medalha de Ouro na edição deste ano do Concurso do Espumante Brasileiro e foi
servido por Salton durante a sua palestra. É elaborado com 70% Chardonnay e 30%
Pinot Noir e maturou em barricas de carvalho americano de 2º e 3º uso por um
período de 12 meses antes de ser engarrafado além e 24 meses de maturação na
garrafa. Possui coloração amarela com tons dourados, prolongado e fino perlage,
intensos aromas cítricos, lácteos e tostados com grande estrutura em boca,
ótima acidez, frescor e cremosidade e longa persistência. Ideal ao
acompanhamento de pratos elaborados a base de peixes e frutos do mar mais
elaborados e estruturados além de paellas, frango e coelho.
Possui 12% de graduação alcoólica
e o ideal é ser consumido na temperatura de 6 a 8oC.
Você encontra os vinhos e
espumantes Valmarino na Wein Haus, loja especializada em vinhos, localizada na
Rua João Pessoa 895, Santa Cruz do Sul, fone (51) 3711.3665 e site www.weinhaus.com.br.
E lembre-se: se beber, NÃO DIRIJA!
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