O Arturzinho era um daqueles
caras ansiosos, quase sem nenhuma paz de espírito, sempre com a cabeça em
vários projetos ao mesmo tempo mas sem nunca concluir nenhum. Distração era a
palavra que definia bem o seu perfil. Casada com ele há alguns anos estava a
Morgana, moça vinda do interior, de hábitos simples e de extrema atenção e
cuidados para com ele. Dona de uma mão habilidosa preparava receitas
fantásticas aprendidas com a sua mãe que aprendeu com a sua avó que aprendeu
com a sua mãe... E o Tutu - como era chamado o Arturzinho pelo cunhado que ele
odiava - muito chegado a um bom prato que era, acabava se deliciando e exigindo
ao máximo os preparos que sua mulher dispendia na lida de forno e fogão. Mas o
nosso figurante também possuía uma alma libertina e inquisidora e,
seguidamente, caía em devaneios gastronômicos com outras cozinheiras. Sim, um
de seus prazeres era correr de cozinha em cozinha buscando novos pratos e novas
delícias ao seu abissal desejo de provar novas “comidas”. E mesmo com toda esta
sua injuriosa atitude ele mantinha um código de ética para consigo mesmo e
carregava alguns princípios: toda vez que saia para beliscar em uma mesa alheia
ele tirava a sua aliança de casamento e a guardava, pois assim sentia-se livre
e solto, sem as amarras da fidelidade culinária acorrentada aos seus pés. E
quando a aliança saia de seu dedo ninguém mais o segurava e os temperos das
outras mulheres era apenas o começo de suas aventuranças. Pois foi numa destas
vezes que o trágico se insurgiu: ao ir jantar a rabada preparada por Jô - uma
mulata de metro e oitenta, escultural e magistralmente bem servida de coxa,
cintura, seios e bumbum e dona de uma mexida de panela desaforadamente ousada –
retirou a aliança e mergulhou nas curvas do rabo servido, sugando cada parte e
arrancando sorrisos de prazer de sua preparadora. Lambuzado de tanto comer, lá
pela madrugada enveredou-se para casa, mas ao defrontar-se com a sua porta,
lembrou que havia esquecido a aliança. Sem muito pensar pôs-se a matutar onde
poderia ter deixado o círculo de seu matrimônio, nem mesmo o auxílio de Jô foi
suficiente para, infelizmente, ele atestar que havia perdido por definitivo a mesma.
E assim sendo o Tutu nunca mais voltou para sua esposa Morgana e,
consequentemente, para os pratos que ela preparava, pois este tipo de traição
os seus princípios não admitiam!
Receita da Rabada da Jô:
(para
6 Arturzinhos)
Ingredientes:
- Um rabo de vaca
- Suco de um limão
- 500g de linguiça de suíno
- 150g de bacon picadinho
- Meia taça de vinho tinto
seco
- Dois dentes de alho bem
picados
- Duas folhas de louro
- Um pimentão vermelho em
rodelas
- Três cebolas em rodelas
- Sal e pimenta do reino à
gosto
Preparo:
Esfregar o suco de limão em
todo o rabo e em seguida lavar bem para tirar o excesso. Em uma panela
preferencialmente de pressão, colocar ao fundo metade do pimentão e da cebola.
Juntar o rabo e as linguiças, o bacon, o sal, a pimenta, as folhas de louro, o
alho, o vinho tinto e o restante da cebola e do pimentão. Tampar a panela e
assim que começar a pegar pressão, deixar por cerca de 40 minutos. Corrigir os
temperos e servir com polenta mole e agrião.
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