Aquela noite de verão
terrivelmente quente fazia da lua um sol à sombra e dele, um corpo boêmio e
escaldante derretendo pelas ruas afora e buscando numa dose supergelada o
consolo para o dia insuportável que passara. Foi ao Silva’s, mistura de bar e
restaurante old fashion, na esquina, próximo da casa de seu chefe. No bar pediu o drink de sempre: Taitânique
(versão tupiniquim) vencedor de onze “martelinhos de ouro” , onde o barman
misturava bourbon, sete gotas de angostura, suco de meio limão e completava com
gelo picado à la Sharon Stone.
O primeiro gole desceu macio como um veludo.
Metódico, beliscava o sexto grão de amendoim quando percebeu suas narinas
inundadas por um mar de cheiro, uma mistura de endro e queijo roquefort
derretendo e que não lhe era desconhecida. Virou-se e percebeu um vestido negro
envolto com um avental de bordado dourado na frente – sim, nesta crônica a
garçonete atende de vestido preto e avental bordado!!! - movendo-se até a mesa ao lado segurando um
belo prato que pelo canto do olho percebeu ser um de seus preferidos. A sua
ex-namorada adorava esta união de cheiros e sabores. Ficou chocado, afinal
moraram juntos por 4 anos e há 2 estavam separados e desde então nunca mais
tinha encontrado-a. Um calafrio subiu pelo buraco de sua meia e dissipou-se
pelo corpo, congelando seus movimentos quando avistou sentada na mesa ao lado
ela, a própria, sua ex-namorada! Imobilizado, fitou seus olhos naqueles mesmos
cabelos negros e na boca vermelho carmim. Que saudade de suas receitas, meu
Deus! Como ela cozinhava bem e agora ela está ali, no seu restaurante
preferido...
Por um breve momento trouxe de volta à lembrança o inverno de
2012, passado em Bariloche e da aposta que fizeram: descobrir quem primeiro
chegava ao teleférico, sem roupas, somente com um espartilho encobrindo-lhes a
visão. Ela ganhou, pois ele tropeçou nas alças da cinta-liga e caiu, de bruços,
defronte a estação, completamente nu, portando apenas um cachecol no pescoço e
uma verruga de nascença no traseiro. Mas o suor escorrendo em sua camisa de
linho branca acabou com a lembrança e trouxe-lhe de volta a realidade,
quebrando o gelo e motivando-lhe para o encontro. Sim, por tanto tempo
separados, por tanto tempo sem saciar a sua fome – em todos os sentidos - habilitava-o
ao contato. Mas, neste exato momento, eis que surge uma loiraça escultural,
aproximando-se languidamente. A loira sentou ao lado de sua ex-namorada, ali,
bem pertinho dele, puxou-a com seus dedos longos e finos trazendo sua boca de
encontro à dela e desferiu-lhe um cinematográfico beijo, um belo velcro.
Embasbacado, acomodou-se novamente na cadeira. Não acreditou no que viu. Tudo
bem, por uma loira daquelas até ele se transformaria...
Então, a garçonete se
aproximou e serviu às moças com uma belíssima porção de Salmão ao Molho
Roquefort – o seu prato preferido! Agora tudo estava claro: as brigas, as
noites que ficou sem jantar, a separação, o espumante quente... Mas Salmão ao
Molho Roquefort ele não poderia aceitar! De jeito nenhum! Tudo menos isso. Esse
era o seu prato preferido! Levantou-se, dirigiu-se até a mesa onde elas estavam
e num gesto ágil, pegou a posta de salmão e saiu correndo rua afora, comendo-o
com as mãos, delirando em largas risadas.
Por algumas noites ainda
viram-no rondando o restaurante. Depois disso nunca mais tiveram notícia dele.
E o Silva´s nunca mais serviu Salmão ao Molho Roquefort.
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