Com expectativa de
quebra em torno de 40% na produção e incertezas sobre a qualidade das uvas, aumento
de tributação e custos produtivos, a safra 2016 do vinho gaúcho mostra-se
preocupante e exigirá o máximo de conhecimento, técnica e dedicação dos
enólogos e vinícolas.
Pois a vindima 2016 começou no
Rio Grande do Sul, impulsionada por uma certa desconfiança de produtores e
consumidores com relação ao volume e qualidade da safra. Fatores climáticos oriundos
do fenômeno “El Niño” tiveram efeitos muito fortes sobre o estado e região Sul,
impactando também nos vinhedos.
Estimativas da Embrapa apontam
cerca de 40% de quebra na safra 2016, o que significa possibilidades de uma grave
crise nas vinícolas, principalmente as pequenas com pouco lastro e
possibilidades mercadológicas.
Márcio Brandelli, Vinícola Almaunica, foto de Raquel Piegas |
Conversamos com alguns
enólogos que já estão imersos nos trabalhos da vindima sobre a expectativa para
a safra recém iniciada e os depoimentos são diversos. Márcio Brandelli, da
Vinícola Almaunica, no Vale dos Vinhedos – um das regiões produtoras menos
atingidas pelo clima – diz-se otimista: “com a nova situação climática que está
se apresentando, com dias ensolarados e de boa amplitude térmica, estamos muito
otimistas. E a previsão é de chuvas abaixo da média até final de fevereiro para
o sul do país”. E complementa que a perda com geadas e doenças fúngicas
provocadas pelo El Niño foi de vinte e cinco por cento. O viticultor estima que
com a quantidade menor de quilos por planta haverá um acréscimo na concentração
de taninos, matéria corante e aromas e que haverá diminuição em torno de 50% na
produção de vinhos finos brasileiros na safra de 2016. E afirma: “o enólogo
deverá agora ter paciência para colher as uvas em seu melhor estágio de
maturação. Esse será o diferencial para os grandes vinhos”.
Gabriela Pötter, Guatambu Estância do Vinho, foto de Leonid Strelieav |
Gabriela Hermann Pötter –
leia-se Guatambu Estância do Vinho – ainda comemora os resultados obtidos em
2015 onde a Guatambu cresceu 175% mas com os olhos na safra iniciada na
vinícola sediada em Dom Pedrito que devido principalmente a três fenômenos
climáticos ocorridos - geada no final de setembro; após ocorreram chuvas e
granizo e por fim o El Niño – o resultado é uma produção de apenas 30% do
potencial e média histórica dos vinhedos. Mesmo com a imensa quebra comenta que
as uvas estão com muita qualidade, com bagas pequenas e mais concentradas. “É
um ano difícil para quem produz uva, mas o consumidor irá se deliciar com o
resultado. Cuidaremos de cada uva como sendo uma jóia rara”, atesta.
A Guatambu realizou várias aplicações
sistemáticas de bio-estimulantes para as plantas rebrotarem após a geada, e
também de nutrientes foliares para aumentar as defesas das plantas contra o
ataque de podridões, já que houveram dias muito úmidos. Nos últimos 10 dias o
tempo está com boa insolação, o que favorece a maturação dos cachos,
preservando a sanidade.
Questionada sobre novidades da
vinícola para o ano, a enóloga explica que pela baixa produção de uvas apenas elaborarará
vinhos das linhas já existentes, para atender a demanda de mercado. Mas lançará
a linha de vinhos com a marca Lendas - oriunda de safras passadas e que
descansam em barricas de carvalho – composta de vinhos varietais como Cabernet
Sauvignon, Tempranillo e Tannat.
André Larentis, da Vinícola Larentis |
Já André Larentis, enólogo da
vinícola homônima do Vale dos Vinhedos, comenta que em relação a qualidade os
próximos dias vão ser decisivos, pela previsão do tempo à princípio de muito
sol, sendo que para os brancos espera-se uma safra dentro da média, e o tintos
que possuem um longo ciclo ainda pela frente a esperança é de uma boa safra,
mas com a expectativa de produção entre 20 a 30 % menor. Para amenizar os efeitos climáticos André diz
que foi necessário esforços muito acima do normal em relação ao manejo das
plantas, com mais horas de trabalho dedicadas a desfolha, desbrote, desponte e
aos tratamentos fitossanitários. “Safras como esta é sempre um desafio para o
enólogo, a trabalho inicial deve ser focado em selecionar as uvas ainda no
vinhedos e posteriormente a bagas, eliminando grãos que não atingiram a
maturação e os comprometidos por alguma doença. Dentro da vinícola, o enólogo
deve ter a sensibilidade para perceber qual é o potencial dos vinhos” comenta.
Miguel Ângelo, da Miolo Wine Group |
“Entrei na vindima 2016
desiludido, hoje estou animado” brinca o enólogo Miguel Ângelo Vicente Almeida,
da Miolo Wine Group e responsável pelos vinhedos localizados na Campanha
Gaúcha, na Fortaleza do Seival em Candiota. Em outubro de 2015 choveram nos
vinhedos 500 mm, o que é muita água em plena floração. “Se janeiro, fevereiro e
março forem sem chuvas a qualidade não será afetada. Mas a quantidade sim, a
nossa estimativa de quebra de produção vai-se cifrar entre 15 a 30%” sentencia.
Para extrair o máximo de suas vinhas, o enólogo focará esforços no controle de
maturação, controle da vinificação, trabalhando dia após dia.
Num momento da economia onde o
dólar alcançou e se mantem em R$ 4,00 freando as importações - inclusive de
vinho pela disparada do preço - o ano teria tudo para ser um marco na história
do vinho brasileiro num incremento de consumo interno há décadas desejado,
eventos como o aumento do ICMS no Rio Grande do Sul e do IPI para bebidas,
somado agora a esta previsão de quebra na safra e muito pano para manga dos
enólogos extraírem o melhor das bagas, a perspectiva de diminuição de produtos
nas gôndolas e possível aumento de preços também para as vinícolas buscarem um
ponto de equilíbrio aos seus custos desanima os amantes e simpatizantes do
vinho brasileiro. O resumo disto é torcer para que tais indicativos tenham
impacto bem abaixo do esperado e o consumidor final, razão de ser, tenha algum
motivo para brindar.
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