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terça-feira, 20 de dezembro de 2011
Alex Atala
Ao final da Rua Barão do Capanema, no sofisticado bairro dos Jardins, em São Paulo, o táxi estaciona defronte um prédio de visual clean, sem identificação alguma, composto apenas por alguns vitrôs rasgados na fachada e uma enorme porta de entrada marrom, quase da altura do pé direito duplo. A impressionante estrutura dá acesso ao D.O.M., ou Dominus Optimus Maximus em latim, simplesmente o vigésimo quarto melhor restaurante do mundo em 2010 e sétimo em 2011, segundo a conceituada revista inglesa Restaurant Magazine. E é ele que abriga o premiado, famoso e competentíssimo chef, Alex Atala, maior ícone da gastronomia nacional na atualidade. E no início de fevereiro tive a satisfação de pessoalmente entender os motivos desta escolha em votação realizada por mais de 800 chefs, críticos e especialistas mundiais do setor.
Ao abrir-se a majestosa porta vislumbra-se o projeto do arquiteto Ruy Othake responsável pela assinatura da decoração do restaurante que exibe uma enorme parede toda em um listrado colorido trazido pelas mãos do artista plástico Ricky Castro em toda a sua altura salientando a cor roxa e marrom como principais contrastando com a cozinha envidraçada no lado oposto ao fundo do estabelecimento interligado por conjuntos de mesa estrategicamente acomodadas.
Ir ao seu restaurante, ser recepcionado pelo próprio chef e ainda provar o seu menu degustação composto de oito pratos e duas sobremesas é uma experiência sensorial inesquecível e incomum. Incomum assim como o estilo do renomado chef, um sujeito sorridente, gentil e acessível. O ex-DJ Alex Atala é quase um cientista. Na sua organizada cozinha encontram-se modernos equipamentos e utensílios com um olhar sobre a atual cozinha espanhola e toda a sua escola vanguardista. E comanda uma brilhante equipe de chefs e estagiários tendo como braço-direito o chef Geovane Carneiro, amigo pessoal de Atala estando juntos desde a inauguração do DOM e que é o responsável pelo andamento da cozinha.
Atala iniciou sua carreira aos 19 anos de idade em uma incursão pela Bélgica, passou por vários restaurantes consagrados em diversos países voltando ao Brasil em 1994 e em 1999 inaugurou o DOM. Durante esta longa jornada suou muito lavando pratos, descascando batatas e agüentando a rigidez e detalhismo de grandes chefs com quem trabalhou. Auto-define-se como um operário da cozinha e tem como grande missão valorizar os ingredientes e a cultura regional brasileira - do charque do sul ao tucupi do norte- utilizando-se para isso de bases clássicas e técnicas atuais. É hoje o maior expoente da gastronomia nacional e o chef brasileiro mais consagrado de todos os tempos, sendo o único brazuca habilitado a dar aulas na mais tradicional escola de gastronomia do mundo o Instituto Cordon Bleu da França. Sua vida atribulada divide a estada em seus dois restaurantes (sim, além do DOM ele é proprietário do Dalva&Dito, também em São Paulo, que completou 2 anos de existência em 2010) e os inúmeros eventos no Brasil e no exterior, além de aulas e workshops pelo mundo afora.
“Sabe Emerson, o que eu gosto mesmo é disso aqui, este é o meu ambiente” disse-me ele dentro da cozinha enquanto levava um prato para aquecer ao forno onde borrifaria um spray de essência de priprióca para mostra-me o aroma. O chef também imortalizou seus conhecimentos em dois livros sucesso de crítica e vendagem: o Por uma Gastronomia Brasileira de 2003 e o Escoffianas Brasileiras de 2008. Foi eleito várias vezes pela crítica especializada o melhor chef brasileiro (leia-se Revista Veja São Paulo – 2 vezes; Revista Gula – 4 vezes; Revista Prazeres da Mesa – 2 vezes)!
Ainda no convite feito para conhecer de perto a sua cozinha lá entre fornos combinados e termomix explicou-me o funcionamento da mesma, apresentando a sua brigada de chefs, cozinheiros e auxiliares, talvez umas dez pessoas no mínimo. O prazer com que ele fala de suas experiências nas lidas de forno e fogão é contagiante. Falou entusiasticamente da priprióca, uma raiz da Amazônia da qual ele extrai uma essência de cheiro amadeirado e cítrico que é usada para aromatizar sobremesas e outros pratos. A bordo de seu descolado tênis e calça jeans ao ser questionado sobre o sul do país disse que curte vir a fronteira do nosso estado, para Bagé e Livramento e praticar um de seus hobbies preferidos, caçar perdiz. Citou também o encantamento pela traíra e seus filetes cortados finamente na idealização de um prato.
Na seqüência do “DOMgustação”, ou seja, o menu degustação foi-me servido em etapas uma seqüência de dez pratos no total, em pequenas porções de sabor ímpar e de combinações mais que inusitadas, resumindo todo o potencial de ingredientes de nosso país ali, dentro de um prato finamente decorado e carregado com uma potência de texturas e sabores sem igual, uma “cozinha de celebração” segundo o próprio. Adiante os partos servidos:
Gel de tomates verdes;
Palmito pupunha, vieras, pêra, algas e citronella;
Ostras empanadas com tapioca marinada;
Arroz negro levemente tostado com legumes verdes e leite de castanha do Pará;
Raia na manteiga de garrafa e tomilho limão com mandioquinha defumada, brócolis e espuma de amendoim;
Quiabo, quiabo, quiabo;
Creme de cogumelos com caldo de vitela, tucupi e ervas da Amazônia;
Costelinha de suíno à Brás;
Aligot;
Torta fondant de chocolate ao creme de café;
Priprioca - Pudim de leite, ravióli de limão e banana ouro.
E quando percebi quase três incontáveis horas tinham se passado como que num estalar de dedos e o restaurante já exibia apenas alguns clientes e pude acompanhar o chef de olhar altivo sentando em uma mesa próxima, bebericando uma garrafinha da água mineral italiana São Pellegrino, sorridente e contemplativo, sabedor que mais uma vez propiciara uma experiência inigualável a todos aqueles que por lá passaram e celebraram. E naquela agradável noite só havia um cara mais feliz que ele: eu!
Artigo publicado no Jornal Gazeta do Sul em 20 de março de 2010.
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